Com ritmo de crescimento menor, dívida do Estado em precatórios atinge R$ 16,1 bilhões

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Avanço real (descontada a inflação) foi de 0,9% em relação a 2019 e confirmou tendência de estabilização, mas, ainda assim, valor a ser quitado até 2024 preocupa

Omar Freitas / Agencia RBS
São 61,8 mil títulos à espera de pagamento, envolvendo milhares de precatoristasOmar Freitas / Agencia RBS

Alvo de preocupação, a dívida do Estado com precatórios voltou a crescer, mas em ritmo menor do que o registrado entre 2018 e 2019, confirmando a tendência à estabilização. Considerando os créditos já inscritos para pagamento no orçamento de 2021, o passivo atingiu a marca de R$ 16,1 bilhões, o que representa, descontada a inflação, 0,9% a mais do que o registrado em 2019, quando a variação real foi de 1,5% na comparação com 2018

O freio no percentual de crescimento indica que o pico da dívida passou, segundo a juíza Alessandra Bertoluci, coordenadora da Central de Conciliação e Pagamento de Precatórios do Tribunal de Justiça (TJ). Como já havia ocorrido em 2019, o Estado deverá encerrar o ano quitando mais títulos do que recebendo. Ou seja, os pagamentos ficarão acima do ingresso de novas pendências.

— Me parece que atingimos o ápice e que estamos conseguindo controlar a dívida. Estão entrando menos precatórios, e o governo do Estado tem priorizado o tema, sem atraso nos repasses. O aumento do valor do estoque se deve, em grande parte, à correção monetária  — analisa Alessandra.

Um conjunto de fatores, conforme a juíza, contribuiu para manter o relativo controle, entre eles, os acordos firmados com precatoristas e a troca de dívidas por meio do programa Compensa-RS.

No caso dos acordos, até o último dia 19, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) contabilizava 7,6 mil negociações fechadas desde 2015, com redução de R$ 1,02 bilhão no valor do passivo (veja os detalhes abaixo), a maior parte em 2019. Ainda que, em cálculo simplista, a cifra represente apenas 6,3% do total devido, o supervisor da Câmara de Conciliação de Precatórios da PGE, Fábio Casagrande Machado, aponta avanços:

— Em 2019, superamos todo o histórico da Câmara e nunca paramos de evoluir. Não é à toa que fizemos um projeto para automatizar as etapas do processo. Agilizamos a comunicação, passamos a usar o WhatsApp com advogados e credores e ganhamos velocidade com os acordos digitais. A correção da dívida é cruel, mas estamos construindo alternativas.

Compensa-RS também integra a gama de ações do governo do Estado para acelerar o abatimento do saldo devedor. Até o dia 21, R$ 1,13 bilhão em precatórios haviam sido trocados por dívidas tributárias (leia mais, abaixo). Isso equivale, grosso modo, a 9% do valor devido.

Corrida contra o tempo

Quando o programa foi lançado, em 2018, havia a expectativa, a partir de sinais emitidos pelo mercado, de que a iniciativa pudesse atrair mais empresas e reduzir a dívida em até 50%. Na prática, isso não se confirmou, mas a avaliação, na Secretaria da Fazenda (Sefaz), é de que o resultado não pode ser menosprezado.

— É o equivalente a uma folha de pagamento do Executivo. Isso é muito dinheiro. Não faz sentido comparar com o estoque, porque ele sofre correção — diz Marcos Antonio Bosio, que já chefiou a seção de precatórios e hoje comanda a divisão de qualidade do gasto na Sefaz.

Subsecretário adjunto da Receita Estadual, Luís Fernando Crivelaro concorda, mas reconhece que o resultado poderia ser melhor. Ele acredita que muitos empresários priorizaram o Refaz de 2019 (programa de refinanciamento de dívidas com uma série de benefícios), o que limitou o impacto das compensações. Em 2020, o obstáculo é a crise do coronavírus.

— Não estamos tendo muita procura, mas o Compensa-RS segue aberto até 2024 e está azeitado — reforça Crivelaro.

Tudo isso, na avaliação da juíza da Central de Precatórios, tem ajudado. A questão é que o prazo para zerar a dívida está se exaurindo: termina em 2024, se nada mudar até lá (o Senado aprovou prorrogação, mas a questão ainda depende de aval da Câmara). Como não há dinheiro suficiente no caixa do Estado, a solução pode ser a busca de empréstimo, com apoio do governo federal.

— O desafio é enorme, tanto para o gestor público, quanto para o TJ, que é a instituição encarregada de fazer a gestão dos pagamentos, porque o estoque, infelizmente, ainda é muito alto. São milhares de pessoas na fila — alerta Alessandra.

Por que a dívida cresceu menos em 2020

a) Conciliação e compensação

Para reduzir o passivo com precatórios, o governo do Estado criou a Câmara de Conciliação, em 2015, e o programa Compensa-RS, em 2018 (veja os detalhes abaixo). O impacto ainda é pequeno diante do tamanho do passivo, mas, ainda assim, vem contribuindo para a redução e tende a avançar.

b) Leis Britto

A onda de sentenças decorrentes das leis Britto, uma das principais causas da explosão da dívida de precatórios, começa a arrefecer. As leis Britto remontam a 1995/1996, quando o então governador Antônio Britto (na época no PMDB) aprovou reajustes salariais para os servidores, que não foram pagos.

c) Opção por RPVs

Sempre que alguém ganha uma ação contra o Estado com valor de até 10 salários mínimos, o crédito vira Requisição de Pequeno Valor (RPV). Se a cifra for maior, torna-se precatório. Como as RPVs são pagas com maior rapidez, muita gente opta por receber menos (via RPV) para não ter de esperar tanto.

Como funciona o pagamento 

O valor repassado mensalmente pelo Estado (1,5% da receita corrente líquida, cerca de R$ 50 milhões, dependendo do mês) é dividido da seguinte forma:

1) 50% por ordem cronológica

A quitação é feita pela ordem de apresentação do título, isto é, do mais antigo ao mais novo. Em caso de precatórios de natureza alimentar (envolvendo pensões e salários), os credores com doença grave, idosos acima de 60 anos ou pessoas com deficiência podem pedir o pagamento de parcela “superpreferencial”. 

2) 50% por meio da conciliação

O pagamento se dá via acordo, com redução de 40% no valor atualizado dos títulos. A modalidade começou com a criação da Câmara de Conciliação de Precatórios, em 2015. Desde então, os titulares são chamados na ordem cronológica para negociar com a Procuradoria-Geral do Estado (PGE). Podem aceitar ou permanecer na fila, à espera do valor integral.

Resultados das conciliações (até 19 de agosto)

  • 7.655 acordos firmados, com redução de R$ 1,02 bilhão no estoque da dívida (6,3% do total)   
  • Deste total, o Estado pagou R$ 605,8 milhões, com economia de R$ 414,6 milhões aos cofres públicos em razão do deságio
  • Em 2019, cerca de 3,5 mil processos foram resolvidos por meio de acordos, reduzindo o estoque da dívida em R$ 534 milhões
  • Agora, está em andamento a sétima rodada de conciliação (a maior já executada), na qual 8.730 credores confirmaram interesse em fechar negócio com o Estado (ao todo, cerca de 13 mil formulários preliminares chegaram a ser preenchidos)
  • A sétima rodada envolve precatórios registrados até 2009, que correspondem a cerca de R$ 4,7 bilhões

A compensação de dívidas

Em março de 2018, o governo estadual lançou o programa Compensa-RS, que segue até 2024. Funciona assim: quem tem débitos tributários com a Receita Estadual inscritos até 25 de março de 2015 como dívida ativa (aquela que o Estado tem a receber), pode oferecer precatórios para regularizar a situação junto ao Fisco. É a compensação de um passivo por outro.

Resultados da troca de dívidas (até 21 de agosto)

  • 501 pedidos de compensação, sendo 435 já concluídos, envolvendo 321 empresas com dívidas tributárias
  • Cerca de 3,7 mil precatórios oferecidos para compensação no valor líquido de R$ 1,2 bilhão
  • R$ 1,13 bilhão em precatórios efetivamente compensados (9% do total da dívida)

Fontes: Central de Conciliação e Pagamento de Precatórios do Tribunal de Justiça, Procuradoria-Geral do Estado e Secretaria Estadual da Fazenda.

Fonte: zero Hora


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