Secretário da Fazenda, Cardoso vê vantagens na adesão para o Rio Grande do Sul. NÍCOLAS CHIDEM/ARQUIVO/JCMarcus Meneghetti
Depois das alterações nas regras do Regime de Recuperação Fiscal, aprovadas pelo Congresso Nacional no final de 2020, a Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz) trabalha agora na reformulação do Plano de Recuperação Fiscal.
O secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso, revela que os técnicos da Sefaz estão trabalhando nisso desde o início do ano e devem se dedicar ao tema no primeiro trimestre.
Entre as alterações, deve constar a adaptação do plano de seis anos para o novo prazo de até 10 anos; a atualização dos indicadores econômicos abalados pela pandemia de coronavírus; e a reorganização de medidas previstas no plano original de 2019, que já se transformaram em lei.
Além disso, Cardoso disse que os técnicos do Estado trabalham junto com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e outros estados na formulação do decreto que irá regulamentar a legislação aprovada no Congresso – também chamada de Plano Mansuetto. Conforme o cronograma da STN, o decreto deve ser assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em março.
Apesar disso, nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o titular da Sefaz pondera que o novo Plano de Recuperação Fiscal não vai ser apresentado necessariamente logo que sair o decreto.
Jornal do Comércio – O que a aprovação do Plano Mansuetto no Congresso Nacional muda em relação ao RRF? O que é interessante ao Rio Grande do Sul?
Marco Aurelio Cardoso – O conceito geral do RRF continua o mesmo: é um plano de recuperação fiscal que o Estado pode fazer, através do qual ele se compromete com determinadas medidas obrigatórias, em troca da possibilidade de não pagar a dívida com a União totalmente, de renegociá-la e da autorização para novas operações de crédito. Entretanto, os detalhes mudaram bastante. Na lei anterior, o regime durava até seis anos: quem ingressasse no RRF teria três anos de carência no pagamento da dívida e, nos outros três, voltaria a pagar em escadinha. Agora o Estado tem até 10 anos de regime: um ano de negociação e nove de fruição. E as prestações (da dívida) vão crescendo mais suavemente. Além da dívida com a União, agora o Estado pode incluir no regime outras dívidas que a União garantiu, como por exemplo nossas dívidas com Banco Mundial, BID etc.
JC – O que mudou nas medidas obrigatórias para o Estado?
Cardoso – A maior parte permaneceu. Mas entrou a obrigatoriedade de um teto de gastos. E as medidas de privatizações se tornaram medidas de desestatização, conceito mais amplo, que reduz a participação do Estado em suas empresas, sem necessariamente vendê-las (por exemplo, a abertura de capital de uma estatal, mantendo o Estado como acionista majoritário).
JC – Apesar dessa possibilidade, o governo mantém a intenção de privatizar CEEE, Sulgás e Companhia Riograndense de Mineração (CRM)?
Cardoso – Sim, até porque são visões sobre o que deve ser feito com essas empresas, independentemente do regime.
JC – Depois dessas alterações, qual é a previsão para ingressar no RRF?
Cardoso – A lei foi homologada há dias. Ainda depende de regulamentação. Desde o início de janeiro, e isso vai prosseguir em fevereiro, estamos trabalhando, a convite da Secretaria do Tesouro Nacional, junto com outros estados, na formulação do decreto de regulamentação da lei. Pelo cronograma da STN, esse decreto (que deve ser assinado pelo presidente) sairá em março, regulamentando os espaços de entrada no regime.
JC – O plano de recuperação fiscal que será apresentado à STN também deve mudar…
Cardoso – Ao longo desse início de ano, primeiro trimestre (de 2021), estamos refazendo o plano. Afinal, tínhamos um plano de seis anos, com previsões econômicas pré-pandemia. Agora o plano será de 10 anos. Além disso, muitas medidas que tínhamos no plano original, de 2019, já viraram leis. Agora, que foi definido como ficou o regime (depois da aprovação do Plano Mansuetto), a STN está refazendo as planilhas do regime. Em cima dessas novas planilhas, desse novo padrão, vamos reapresentar o nosso plano. Então, nesse momento, estamos trabalhando na formatação do regime junto à STN e outros estados e na reformulação do nosso Plano de Recuperação Fiscal.
JC – O Estado vai reapresentar o plano à STN em março, quando sair o decreto?
Cardoso – O Estado não apresenta em março. A partir de março, o Estado pode pedir a adesão. Ainda não está claro quando vamos pedir a adesão inicial, porque depende da regulamentação. O plano – que elenca tudo o que o Estado vai fazer durante o Regime – exige uma discussão ao longo de meses. Vamos reconstruir isso ao longo deste ano.
JC – O senhor mencionou que a nova lei acrescentou uma exigência no Plano de Recuperação Fiscal dos estados que aderirem ao RRF: a criação de um teto de gastos. A ideia agora é aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui o Teto, que já tramita na Assembleia?
Cardoso – Entre as medidas obrigatórias – leis, no caso – a única que o Estado ainda não possui aprovado é um teto de gastos. Enviamos a PEC do Teto de Gastos à Assembleia Legislativa no início de dezembro (de 2020), junto com outros projetos. Essa PEC tem um artigo que diz que, caso o Estado esteja no regime, vale a regra de teto do regime, caso seja diferente da nossa. Então, em tese, aquela proposta já atenderia essa condição (de ingresso ao RRF). A nossa ideia é trabalhar na aprovação daquela proposta. Como é PEC, a tramitação é um pouco mais longa, não cabe regime de urgência. Ela foi enviada no final de 2020, quando o debate acabou centrado na reforma tributária. Agora vamos nos concentrar na aprovação dela no primeiro semestre de 2021.
JC – Nesse esforço de equilíbrio fiscal estabelecido pelo RRF, é fundamental não perder receita. A prorrogação das alíquotas de ICMS, pela lei aprovada na Assembleia no final de 2020, vai até 31 de dezembro de 2021. Isso não pode prejudicar o ingresso no Regime?
Cardoso – Essa projeção futura da receita do Estado é até mais profunda do que o RRF. Trata da possibilidade de oscilação da receita, na ordem de R$ 2,5 bilhões de um ano para outro. Na projeção que vamos reconstruir, vamos partir do que a legislação vigente determina. Então, para a projeção de 2022, vamos considerar que não haverá alíquotas majoradas de ICMS. Vamos tentar compensar com crescimento econômico ou outra medida que o Estado poderá fazer. Apesar de termos reformas profundas em andamento, que tem melhorado os números do Estado, a diminuição das alíquotas de ICMS representa uma variação muito grande da receita em um ano, sem transição. Então, (na reformulação do Plano de Recuperação Fiscal) vai ser necessário que o Estado faça projeções mais baixas de receita e tem que verificar se vai ser possível equilibrar no regime. Maais importante do que a planilha do RRF, é o que vai acontecer na realidade (quando o patamar de ICMS diminuir em 2022).
JC – O principal empecilho ao ingresso do Rio Grande do Sul no RRF era a discussão em torno do gasto com pessoal. O Tribunal de Contas do Estado apontava um número menor; o Palácio Piratini apresentava um maior; a STN calculava de outra maneira. Como ficou esse impasse?
Cardoso – Essa é outra alteração feita pela nova lei do RRF. Passam a ter diferentes possibilidades para ingressar no regime. A questão do índice de despesas com pessoal não é mais um requisito obrigatório. Então, o Estado pode apresentar outros indicadores alternativos, como a relação entre despesa e receita corrente, como um todo – não necessariamente a de pessoal. De qualquer forma, deve prosseguir a discussão em torno da publicação dos demonstrativos fiscais com o padrão da STN.
Fonte: Jornal do Comércio