As duas propostas, já protocoladas na Assembleia, são inspiradas em exemplos da Espanha e do Estado de São Paulo
Junto da revisão de alíquotas prevista na reforma tributária estadual, o governo de Eduardo Leite aposta em outra frente para estimular bons pagadores de impostos e superar barreiras entre os contribuintes e o Fisco. Trata-se de dois projetos de lei que tramitam em paralelo ao texto principal em debate na Assembleia Legislativa: um deles é inspirado na Espanha e o outro, no Estado de São Paulo.
Ambos foram encaminhados ao parlamento na última segunda-feira (10) e devem ser alvo de menor resistência no plenário porque atendem a reivindicações históricas do empresariado.
O primeiro projeto cria o Programa de Estímulo à Conformidade Tributária (Nos Conformes RS), que existe em São Paulo desde 2018, com praticamente o mesmo nome. A ideia é classificar as empresas com conceitos de A a D, a partir de quesitos como o pagamento em dia de ICMS, que será condição para o nível máximo (A). Quem se sair melhor receberá bônus fiscal na forma de desconto. Isso ainda terá de ser regulamentado por lei.
O outro texto institui o Código de Boas Práticas Tributárias do Estado, nomenclatura similar à adotada na Espanha. A intenção é reforçar a colaboração mútua entre contribuintes e a Receita Estadual, definindo de forma clara direitos e deveres e criando um conselho com a participação de entidades representativas da sociedade.
Esse conselho poderá sugerir medidas para simplificar o sistema e propor a instalação de câmaras temáticas para tratar de problemas específicos. Há autorização, inclusive, para a pactuação de acordos setoriais que solucionem impasses e estabeleçam metas, incluindo ações de combate à informalidade e à sonegação, irregularidades que, na prática, acabam sabotando quem age dentro da lei.
As ações, segundo o subsecretário da Receita Estadual, Ricardo Neves Pereira, fazem parte de uma mudança de cultura em curso na instituição, menos punitiva e mais preventiva.
— Os projetos estão incluídos no âmbito do programa Receita 2030 (lançado em junho de 2019) e estabelecem uma nova forma de relacionamento entre o Fisco e os contribuintes, que privilegia a confiança e a cooperação voltadas para o desenvolvimento econômico e social do Estado — resume Pereira.
Diretor-executivo do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), Bruno Negris diz que as duas proposições, ao estimularem o diálogo, vão ao encontro do que há de mais moderno na área. Estão em linha, segundo ele, com as diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
— Estimular a adimplência é o caminho. É claro que o sonegador contumaz deve ser punido com rigor, mas a maioria dos contribuintes quer fazer o certo. Esses projetos tendem a dar maior segurança jurídica aos empresários e, assim, combater a informalidade, que gosta da bagunça tributária. Quando você consegue estabelecer um entendimento claro, com a participação de diferentes setores, você só tem a ganhar — destaca Negri.
À frente do Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado (Sindifisco-RS), Altemir Feltrin da Silva também avalia as medidas como positivas, mas reforça a necessidade de nomeação de novos auditores fiscais para executar as ações. Segundo ele, há defasagem de 50% no quadro de profissionais em atividade, o que pode dificultar o intento. Silva diz que a entidade apoia as propostas.
— Elas são partes de um mesmo processo, que tem por princípio facilitar o cumprimento de obrigações tributárias, reduzir custos e simplificar a legislação. Isso é bom para todos — opina o auditor.
Tanto é verdade que as proposições são alvo da simpatia de órgãos como a Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul). Presidente da organização, Simone Leite acredita que não haverá empecilhos no Legislativo, ao contrário do texto principal da reforma, que é visto com ressalvas.
— As duas propostas melhoram o ambiente de negócios no Estado. Empresas que pagam em dia seus impostos vão ser beneficiadas, e isso é ótimo. Além de tudo, vai reduzir a burocracia e ampliar os direitos dos contribuintes, sem o risco de aumentar a carga tributária. É tudo o que sempre defendemos — pontua Simone.
A previsão é de que os textos, protocolados em regime de urgência, sejam votados na segunda quinzena de setembro.
As propostas
1) Projeto de Lei nº 185, de 2020
Do que trata
Institui o Programa de Estímulo à Conformidade Tributária (Nos Conformes RS) e estabelece regras para facilitar e estimular o pagamento de tributos em dia
Objetivo
Classificar e premiar as empresas pelo bom desempenho junto ao Fisco, considerando diferentes quesitos, entre eles o pagamento em dia de ICMS. É uma forma de incentivar os contribuintes a ficarem em dia com a Receita
Como vai funcionar
- As empresas serão classificadas pela Receita Estadual nas categorias A, B, C, D e NC (quando por algum motivo não for possível a classificação), com base no cumprimento das obrigações tributárias
- A letra A será a pontuação máxima. Significa que o estabelecimento está fazendo tudo certo. A letra D é o oposto
- Quem receber A, ganhará um bônus fiscal na forma de desconto em ICMS
- O programa Nos Conformes RS também permitirá a celebração de acordos com setores e empresas para aumentar a segurança jurídica, evitando autuações por erros de preenchimento ou de interpretação da legislação
- Todo o detalhamento será definido a partir da regulamentação da lei pelo governo do Estado no prazo de seis meses
2) Projeto de Lei nº 186 de 2020
Do que trata
Institui o código e conselho de Boas Práticas Tributárias do Estado e autoriza a criação das Câmaras Técnicas Setoriais
Objetivo
Esclarecer quais são os direitos e obrigações do contribuinte e da Receita Estadual, definir o que são boas práticas e estimular a construção de ambiente saudável de relacionamento entre as partes, criando espaços formais de discussão com possibilidade de acordos setoriais para facilitar e simplificar a tributação
Como vai funcionar
- Para viabilizar a aplicação da lei, é proposta a criação do Conselho de Boas Práticas Tributárias (CBPT)
- O conselho terá a participação de representantes da Receita Estadual, da Procuradoria-Geral do Estado, de entidades setoriais (como Federasul, Fiergs, Farsul e Fecomércio) e de órgãos de fiscalização do exercício profissional dos agentes envolvidos (OAB-RS e Conselho Regional de Contabilidade – CRC-RS).
- Os custos de manutenção do CBPT serão divididos entre o Estado e as entidades. Isso será definido por regimento interno
- O conselho terá 18 membros, além de presidente e vice, sendo que nenhuma função será remunerada. Eles terão mandatos de dois anos, com possibilidade de recondução
- Caberá ao conselho sugerir boas práticas tributárias, receber, analisar, avaliar e encaminhar sugestões apresentadas por contribuintes, entidades representativas e pelas autoridades fiscais, sugerir medidas para evitar a sonegação de impostos etc.
- O conselho também poderá criar câmaras técnicas setoriais
- As câmaras irão discutir questões específicas de cada setor, na tentativa de estabelecer pactos para a criação de regras tributárias e, assim, dar mais previsibilidade e clareza ao tema
Fonte: Zero Hora