Pressionado pelo Governo Federal, após uma absurda decisão do STF determinando que as alíquotas de combustíveis, comunicação e energia elétrica não poderiam ser superiores à alíquota modal do ICMS, o Congresso Nacional, quebrando o pacto federativo, aprovou, em junho de 2022, a inconstitucional Lei Complementar 194/22. Passados 5 meses de sua aplicação, temos o efeito deletério de perda de R$ 2,8 bilhões na arrecadação do ICMS no RS em 2022, projetando uma perda de R$ 6,72 bilhões em 2023.
É a repetição da fórmula que sufoca os Estados desde a famigerada Lei Kandir de 1996, combinada com a renegociação das dívidas de 1998: a União retira receita dos estados e impõe juros exorbitantes e inconstitucionais que tornam a dívida interminável, pois os pagamentos não são suficientes para liquidá-la.
A história se repete como farsa, alguém já disse! Mas, no caso da LC 194/22, combinada com o Regime de Recuperação Fiscal – RRF, a farsa se transformou em tragédia. A adesão ao regime não passa de um “empurrar com a barriga” a gigantesca dívida estadual de mais de R$ 75 bilhões para, ao final do período, “engordar” a conta em mais R$ 25,6 bilhões, levando-a ao patamar de mais de R$ 100 bilhões em 2031, a valores de hoje.
Para se ter uma ideia da magnitude dos valores, em 2023, o total com o pagamento de amortização e juros da dívida sem o RRF seria de R$ 6,504 bilhões, valor quase idêntico à perda provocada pela LC 194/22.
Não há compensação permanente de perdas arrecadatórias, nem redução de dívidas na LC 194/22 e no RRF, todavia, pelo acima exposto, deveria haver! Em outras palavras, ao invés de “empurrar a dívida”, essa perda de ICMS de R$ 6,72 bilhões, totalizando ao redor de R$ 60 bilhões durante o Regime, teria que ser integralmente computada como pagamento desta!
A busca pela compensação é a postura que se espera do governo gaúcho pois, afinal de contas, durante a campanha eleitoral, o Presidente disse que chamaria os Governadores para fazer um grande acordo sobre as dívidas estaduais ainda em janeiro. Se isso não acontecer, estaremos novamente assistindo à mesma farsa de 1996, quando os estados perderam recursos (mais de R$ 6 bilhões anuais no RS) com a lei Kandir, em troca de uma compensação que não cobriu mais do que 10% das reais perdas de ICMS.
Paulo Ricardo Saldanha Guaragna é Auditor Fiscal da Receita Estadual aposentado, especialista em Direito e Economia Internacional pela ESAF-União Europeia e escritor.
Marcelo Ramos de Mello é Auditor Fiscal da Receita Estadual, máster em Administração e Gestão Pública pela Universidad de Alcalá de Henares – Espanha.