Piratini luta na Justiça para arrecadar R$ 1 bi com dois processos envolvendo ICMS

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Ações nos tribunais superiores envolvem discussão jurídica sobre cobrança de imposto estadual relativo a produtos da cesta básica e assinatura de telefonia.

Dois processos judiciais em fase final de discussão – com chance de definição ainda este ano – podem render R$ 1 bilhão aos cofres do Estado e, por tabela, beneficiar os municípios gaúchos. Ambos os casos têm origem em cobranças feitas pela Receita Estadual a empresas que deixaram de recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS). As pendências viraram dívidas e foram parar na Justiça.

— São ações antigas, que discutem a aplicação da legislação tributária e que só avançaram por conta de uma série de autuações feitas no passado — diz o subsecretário da Receita Estadual, Mario Luis Wunderlich dos Santos.

Um dos casos envolve a GVT (hoje no grupo Telefônica Brasil/Vivo) e um debate jurídico em torno da cobrança de ICMS sobre a assinatura básica de telefonia. O outro trata do recolhimento do imposto sobre produtos da cesta básica e inclui a Santalúcia S/A, dona da marca de arroz Blue Ville (veja os detalhes abaixo).

Os processos estão no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), últimas instâncias de julgamento. Até o momento, a vantagem é da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), que aguarda a análise dos embargos declaratórios apresentados pelas partes. Esses recursos são utilizados, em geral, quando há alguma dúvida sobre a decisão (imprecisão ou omissão, por exemplo). Segundo a PGE, dificilmente alteram o resultado.

— Estamos muito otimistas. O Estado deve ter ganho de causa nos dois processos, e isso produzirá efeitos sobre todos os demais casos que envolvem situações semelhantes — afirma o procurador Luis Carlos Kothe Hagemann, coordenador da procuradoria junto aos Tribunais Superiores.

O impacto se explica por duas razões. No processo da Santalúcia, o STF determinou a repercussão geral da decisão. Isso significa que a definição vale para todas as ações que tratam do mesmo tema – e são dezenas. No caso da GVT, eventual vitória da PGE influenciará outros processos idênticos envolvendo a própria organização (foram várias autuações, que viraram diversas ações judiciais).

A projeção de valores feita pela Secretaria da Fazenda – R$ 1 bilhão – leva em conta esse efeito-cascata e, em caso de êxito, acabará favorecendo, também, as prefeituras. Por lei, as administrações municipais recebem 25% de todo o ICMS arrecadado pelo Estado – inclusive quando o dinheiro chega pela via judicial.

Considerando a estimativa oficial, os municípios ficariam, então, com R$ 250 milhões e o governo gaúcho, com R$ 750 milhões (o equivalente a metade de uma folha bruta mensal do Executivo).

Embora o dinheiro dificilmente entre de uma só vez no caixa e o julgamento dos embargos ainda não tenha sido marcado (pode ocorrer a qualquer momento), Wunderlich afirma que “qualquer reforço é importante, diante das dificuldades financeiras do Estado”, que vem parcelando os salários de servidores desde fevereiro de 2016, sem trégua.

 

A disputa

Entre as ações envolvendo o governo do RS, dois casos estão em fase final de julgamento e podem render R$ 1 bilhão aos cofres estaduais, segundo a Secretaria da Fazenda e a Procuradoria-Geral do Estado (PGE).

ICMS sobre produtos da cesta básica

Do que trata o processo

– O ICMS cobrado pelo Estado na venda ao consumidor final de produtos da cesta básica é de 7%.

– Quando as empresas adquirem esses produtos de outros Estados, o ICMS é de 12% (recolhido para o Estado de origem do produto).

– Pelas regras do ICMS, quando a carga tributária é menor na operação seguinte (no caso, cinco pontos percentuais), a diferença não pode ser usada para abater o tributo em transações futuras.

– Como algumas empresas fizeram isso, a Receita Estadual autuou as companhias, cobrando a diferença relativa aos créditos que não deveriam ter sido usados, com multas e juro.

– As empresas recorreram, e a discussão foi parar no Judiciário.

– Em 2011, o Tribunal de Justiça do RS considerou constitucional a exigência do Estado, levando a empresa Santalúcia S/A a entrar com recurso extraordinário no STF.

– Em 2014, a questão ganhou repercussão geral, isto é, ficou decidido que o entendimento da Corte nesse julgamento valerá para todos os casos envolvendo o tema.

– O STF negou o recurso da empresa.

– Em fevereiro de 2015, a Santalúcia interpôs embargos de declaração. O relator, ministro Gilmar Mendes, liberou o processo para julgamento, ainda sem data.

Valor estimado

R$ 600 milhões, considerando a repercussão geral.

O que acontece se o Estado ganhar

Segundo a PGE, os valores estão garantidos por fiança bancária (quando as partes reservam dinheiro para a sentença). O valor desse processo específico (não informado pelo Estado) deverá ser pago automaticamente. Quanto aos demais, como o STF deu repercussão geral à decisão, a PGE solicitará a execução judicial imediata.

O que diz a defesa da Santalúcia

O advogado José Luiz Borges Germano da Silva, que representa a empresa, apresentou embargos de declaração postulando que o STF examine “omissão havida no julgamento”, por ter “ignorado jurisprudência anterior do próprio STF”. Caso não tenha êxito e a decisão seja mantida, Germano pediu que os efeitos passem a valer apenas a partir da decisão final, não atingindo situações já consolidadas. Com isso, a dívida da empresa com o Estado estaria extinta.

ICMS sobre a assinatura básica de telefonia

Do que trata o processo

– Ao longo dos anos 2000, algumas companhias telefônicas deixaram de recolher ICMS sobre assinatura básica de telefonia no Estado por entenderem que o imposto não era devido.

– A Receita Estadual autuou essas empresas, e elas se tornaram devedoras do Estado. A discussão foi parar na Justiça.

– Em maio de 2007, a GVT (hoje no grupo Telefônica Brasil/Vivo) foi uma das companhias acionadas judicialmente para pagar valores pendentes – são diversos processos, segundo a PGE, que tramitam em várias instâncias. A companhia recorreu.

– Em fevereiro de 2013, o Judiciário  avalizou o recurso da GVT e determinou a extinção da dívida, levando a PGE a recorrer.

– O recurso da procuradoria do Estado foi aceito, e o Tribunal de Justiça do RS (TJ-RS) restabeleceu o débito em abril de 2014. A empresa, então, apelou outra vez.

– Seis meses depois, o TJ-RS rejeitou o novo recurso da GVT, e o caso foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde está desde 2015, prestes a ter um desfecho.

– Depois de sucessivos recursos perdidos, a empresa entrou com embargos declaratórios em março deste ano. Ainda não há data prevista para o julgamento.

Valor estimado

R$ 390 milhões, considerando todos os processos do Estado envolvendo a GVT .

O que acontece se o Estado ganhar

Nesse caso, a garantia não se deu por fiança bancária, mas por penhora de bens da empresa. Caso o Estado vença esse processo específico (no valor original de R$ 25 milhões, que ainda será atualizado), a PGE afirma que a decisão repercutirá sobre todos os demais processos envolvendo a GVT, chegando a R$ 390 milhões. É possível, contudo, que o desfecho demore um pouco mais, pois essas outras ações tramitam em diferentes instâncias.

O que diz a defesa da GVT

A reportagem entrou em contato com o escritório Sacha Calmon, responsável pela defesa da empresa, e com um dos advogados do processo, André Mendes Moreira, mas não obteve retorno.

Fonte: GaúchaZH

Foto: Carlos Macedo / Agencia RBS


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