Professor da FEA diz que é fundamental, mas proposta deve enfrentar entraves que podem desconfigurá-la
Entre uma reforma administrativa votada às pressas e o polêmico desenrolar da reforma do sistema previdenciário, uma reforma sobre unificação de impostos começa a ser processada pelo Legislativo. Na última quarta-feira (22), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou a tramitação de uma reforma do sistema tributário brasileiro, de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e do economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCIF). A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) aguarda a criação de uma comissão especial para discuti-la e tem seu cerne nos impostos sobre bens e serviços.
A ideia é que os cinco tributos que atuam nesse âmbito, os impostos PIS (Programa de Integração Social), Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e o ISS (Imposto sobre Serviço), sejam todos reduzidos em um único: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). “É como se faz em todos os países, seria modernizar o Brasil para o que se faz no resto do mundo. O modelo tem seus defeitos, mas é o melhor que dá para fazer em termos de tributação no consumo hoje”, contou ao Jornal da USP no Ar o professor Gustavo Vettori, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP.
O professor complementa que o Brasil não possui esse imposto unificado por ter se formado historicamente sobre um modelo dividido. O ICMS foi deixado para competência dos Estados, os municípios recebem os repasses do ISS, enquanto PIS, Cofins e IPI são impostos federais. Além disso, os tributos incidem numa ideia de local de produção, então quem manda na carga tributária que será aplicada é o Estado de origem da mercadoria ou serviço. “Isso acaba gerando uma guerra fiscal que já é conhecida e figura diariamente nos jornais”, comenta.
O ponto que concentra a maioria das críticas à reforma proposta diz respeito ao quanto ela interfere na autonomia federativa, já que hoje quem define, institui e revoga as alíquotas do ICMS e ISS são os próprios Estados e municípios. No entanto, Vettori explica que eles ainda participarão da decisão na definição da alíquota a ser tributada, e o verdadeiro ponto crucial é que ela não será mais definida pelo local onde os bens e serviços foram produzidos, mas sim onde serão consumidos.
Isso afetará a atual lógica de incentivos fiscais para atração de indústrias que compõe a “guerra” mencionada pelo professor. Ele explica que existe uma lógica dos Estados agirem de forma autônoma para distribuir incentivos fiscais; isso gerou um problema que, no final das contas, não ajuda ninguém, porque o ganho efetivo é baixo e com a reforma os incentivos seriam inviabilizados. “Se o Rio de Janeiro quiser deixar uma alíquota mais baixa que a de São Paulo, não irá atrair nenhuma indústria. A única coisa que será afetada é o preço do produto ou serviço a ser consumido, que será mais barato no Rio”, exemplifica.
Vettori ressalta que casos em que a política de desenvolvimento regional depende exclusivamente de incentivo fiscal terão que ser discutidos de forma profunda, como a Zona Franca de Manaus. Para reduzir os impactos da aplicação da reforma, ele explica também que sua implementação será feita gradualmente. Uma transição de dez anos, em que alíquotas dos impostos já existentes vão sendo reduzidas, ao passo que se aumenta gradativamente a alíquota do imposto unificado, o IBS.
O andamento da proposta também dependerá muito do desenrolar da reforma da Previdência. O professor conta que o governo federal agora está totalmente focado na Previdência, e inclusive não se manifesta sobre a reforma tributária para não afetar sua pauta principal. Sem o apoio do Executivo, o projeto de reforma tributária pode ser completamente modificado ao longo da tramitação pela Câmara e Senado.
Fonte: Jornal da USP
Foto: Marcos Santos/USP Imagens