A dona de casa Gislaine de Oliveira Carlos, de 25 anos, completou 40 semanas de gestação na segunda-feira, quando já estava com a família em um abrigo
Por Paolla Serra
— Brasília
Na última sexta-feira, a dona de casa Gislaine de Oliveira Carlos, de 25 anos, e o marido, o auxiliar de obras Pierry Silva, de 23, receberam o alerta de que teriam que deixar a casa da família, submersa diante das enchentes no bairro Harmonia, em Canoas, no Rio Grande do Sul. Prestes a completar 40 semanas de gravidez, a jovem foi resgatada de barco, pernoitou em uma academia de ginástica, foi levada a um abrigo e finalmente deu à luz a Tyson, quase 72 horas depois.
— Tínhamos feito o quartinho para ele e, com as chuvas e a água só subindo, a única coisa que eu pedia a Deus era: espera mais um pouco. Mas não dava. Na segunda-feira, induzimos o parto normal por quase um dia. Não conseguimos e então partimos para a cesárea. Foi muito dolorido. Mas agora só o que penso é que ele é um pontinho de luz e esperança em meio ao caos e ao desastre — emociona-se Gislaine.
O casal e o primogênito, Kalel, de 4 anos, deram entrada no domingo à noite na Associação dos Auditores-Fiscais da Receita Estadual (Afisvec), cuja sede social foi transformada em um centro de acolhimento que reúne mais de 150 vítimas da inundação. No local, a dona de casa foi atendida por médicos voluntários e encaminhada ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Tyson nasceu saudável, com 2.830kg e 48cm:
— Nossa casa ainda continua debaixo d’água e a previsão que recebemos é que demoraria pelo menos um mês para voltarmos para lá. Diante de tantas adversidades, até que está tudo dando certo. Nessa confusão toda que passamos, Kalel ainda conseguiu comemorar por estar andando de barco pela primeira vez.
O nascimento de Tyson foi revelado pelo jornal “Zero Hora”. Presidente da Afisvec, Eduardo Jaeger conta que foi avisado sobre o drama da família pela irmã de Gislaine, funcionária da associação. Após eles se mudarem, ficarem ilhados em um sobrado e desprovidos de água, comida e banho, foi necessária uma força-tarefa para conseguir buscá-los às margens da Rodovia do Parque (BR-448).
— As jornadas têm sido longas por aqui. Em contato com a prefeitura, decidimos abrir nosso ginásio para receber os desabrigados. Atualmente temos mais de 60 voluntários trabalhando conosco e, apesar de todo o esforço, chegamos a ficar, por exemplo, quase dois dias sem água para uso nos banheiros, o que nos emociona demais. Então a chegada do recém-nascido traz um alento em nossos corações nesse momento de tanta dor e ânimo de que em algum momento a vida vai voltar ao normal por aqui — diz.
Gislaine e Tyson precisam de produtos de higiene, como lenço umedecido, sabonete, shampoo e talco; roupas, como blusas e sutiã de amamentação; além de utensílios, como banheira para o bebê e cama para a mãe. As doações podem ser destinadas a Afisvec, na Rua Salvador Calamucci, número 56, em Carvalhada, na Zona Sul da cidade.
O Rio Grande do Sul já contabiliza mais de 109 mortos e 130 desaparecidos desde a semana passada. A estimativa é que a crise climática tenha comprometido a vida de 1,4 milhão de gaúchos.