Série de entrevistas Zero Hora: candidato ao governo do Estado pelo PT, Edegar Pretto

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Série de entrevistas ZH: De 29 de agosto a 8 de setembro, GZH publica entrevistas com candidatos a governador do RS. O foco é discutir problemas do Estado e aprofundar as propostas de governo. Cada um dos oito postulantes de partidos com ao menos cinco representantes no Congresso terá entrevistas mais longas. Os outros concorrentes dividirão uma reportagem em 8/9. A ordem de publicação é alfabética, conforme o nome que será apresentado na urna.

“Não podemos deixar criança estudar de barriga vazia”, afirma o candidato Edegar Pretto

Se eleito, concorrente do PT também pretende rediscutir os termos do regime de recuperação fiscal e mudar o atual modelo de concessão de rodovias

Postada em 29/08/2022 -por FÁBIO SCHAFFNER

Anselmo Cunha / Agencia RBS
Pretto tem 51 anos e é formado em Gestão PúblicaAnselmo Cunha / Agencia RBS

Em 2018, pela primeira vez o PT ficou de fora do segundo turno da sucessão estadual. Quatro anos depois, o partido rejuvenesce os quadros ao lançar ao governo o deputado estadual Edegar Pretto. Aos 51 anos e formado em Gestão Pública, Edegar foi o mais votado do partido nas três últimas eleições para a Assembleia Legislativa.

Se eleito, Edegar pretende rediscutir os termos do regime de recuperação fiscal, anular o processo de venda da Corsan e mudar o atual modelo de concessão de rodovias. Para o candidato, o Estado precisa usar os bancos públicos para financiar o desenvolvimento com políticas específicas para a agricultura, a indústria e as pequenas, micro e médias empresas.  

O seu slogan de campanha, palavra de gaúcho, mira na promessa que Eduardo Leite fez de não disputar a reeleição, mas o PT fez parecido em 2002, quando Tarso Genro renunciou à prefeitura da Capital para disputar o Piratini. Não é uma contradição?  

O governador começou a faltar com a verdade na eleição passada, ao dizer que se fosse eleito não concorreria à reeleição. No segundo turno, sacou mais uma vez a palavra ao dizer que o Banrisul e a Corsan não seriam privatizados. Foi um diferencial para ele vencer. Tem uma série de promessas não cumpridas. O Tarso pagou o preço pela palavra empenhada (ao perder a eleição). O governador que renunciou não conhece bem o Rio Grande. Se conhecesse, saberia que palavra é inegociável para o gaúcho.

O PT ficou fora do segundo turno pela primeira vez em 2018. Como superar o antipetismo no Estado?  


Se teve antipetismo, é página virada. O PT está muito à frente dos demais partidos em preferência partidária. Na última eleição, botaram na cabeça das pessoas que bastava tirar o PT que os problemas seriam resolvidos. Hoje as pessoas estão inseguras, preocupadas com a fome, o emprego, a educação dos filhos. Nunca a juventude esteve tão desanimada. Então, tudo isso fez parte de uma narrativa, uma onda que passou. E com toda dificuldade da última eleição, elegemos pela quinta vez consecutiva a maior bancada na Assembleia Legislativa. Agora estamos em outra condição, o presidente Lula foi inocentado e temos a graça de contar com Olívio Dutra como candidato a senador.

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O regime de recuperação fiscal impõe congelamento de gastos, limita reajustes salariais e contratação de servidores. Qual sua opinião sobre o regime e como pretende lidar com as regras?  


O regime é um péssimo negócio. O governador perde autonomia. Ainda impossibilita de se produzir políticas diferenciadas para setores que são importantes à economia. Somente no governo Leite, a dívida cresceu R$ 11 bilhões com a suspensão do pagamento. Então, o regime não resolve a dívida. Pelo contrário, amplia uma conta injusta e impagável.  

Como reverter a queda de arrecadação prevista para 2023 a partir da redução das alíquotas de ICMS pelo governo federal?  


A gente não sobrevive do passado, mas temos um exemplo que funcionou melhor do que agora: colocar o aparato de Estado para financiar o desenvolvimento. Quando o Tarso assumiu, a carteira de crédito do Banrisul era de R$ 17 bilhões. No fim do governo, era de R$ 30 bilhões, direcionados especialmente à indústria moderna. Não temos política agrícola. Quase todo o ano passado nós pagamos a cesta básica mais cara do país. Pequenas, micro e médias empresas geram 70% do emprego no Estado. Por que o Banrisul não pode ter juros subsidiados para esses setores?  

O PT governou pela última vez esgotando a capacidade de endividamento e sacando R$ 5,6 bilhões dos depósitos judiciais. Como governar num quadro de engessamento fiscal e com as perdas de receita no ICMS?  


Tendo uma nova relação com a União. Não é possível um Estado com a importância do nosso ter um governador que não conversa com o presidente, mesmo tendo votado e feito campanha para ele. Não vai funcionar assim. Temos que rever o regime de recuperação fiscal, rever essa medida de passar a conta amarga dos combustíveis para os Estados pagarem. E investir nos setores produtivos. Já comprovamos que dá certo, a economia reage positivamente.  

Temos que rever o regime de recuperação fiscal, 
rever essa medida de passar a conta amarga 
dos combustíveis para os Estados pagarem.

O senhor pretende privatizar o Banrisul?  


O Banrisul não será privatizado. Será fortalecido, mas não é só para o governo se vangloriar que está dando lucro. É para ajudar a financiar o desenvolvimento. Ele, o Badesul e o BRDE têm que ser os patrocinadores de políticas públicas direcionadas para setores que ajudam a nossa economia.  

Quais os seus planos para a Corsan? O senhor pretende reverter o processo de privatização?

Vou anular todos os atos de privatização da Corsan.  

A Corsan tem uma das tarifas mais caras do país. Como tornar a empresa competitiva e cumprir a meta de universalizar coleta tratamento de esgoto até 2033?  


O marco do saneamento foi produzido na pandemia. Há justificativas para mudar isso com negociação. A Corsan é uma (companhia) viável, está presente em 317 municípios e tem tarifa social porque é pública. Se deixar de ser, vai pagar impostos e aumentar a tarifa. Não vou deixar fazerem com a água o que fizeram com a nossa luz. No primeiro vento que deu na Região Metropolitana, ficamos uma semana no escuro, donos de padaria, de armazém perdendo todo seu estoque. Você vai para o 0800, ninguém te atende e não sabe em que porta bater.  

O senhor pretende reverter medidas aprovadas nas reformas da previdência e administrativa do governo Leite?  


Não assumo nenhum compromisso irresponsável de tentar resolver as coisas com uma assinatura. Tem de ver o que é possível. O governador se vangloria de superávit, mas boa parte foi tirada de aposentados que trabalharam a vida toda e no momento de usufruir do descanso houve um descontão no contracheque. Isso não é justo. Agora, não posso dizer que vou reverter isso tudo. O Estado que eu quero se desenvolve parelho e ninguém fica para trás.

Qual será sua política salarial para o funcionalismo?  


Tenho me comprometido a tratar o funcionalismo com respeito, voltar a conversar. O Estado tem se comportado como adversário. Nunca vi dono de empresa se vangloriar de não dar aumento aos colaboradores, mas já vi o governador se vangloriar que não deu aumento aos servidores. Vou estabelecer uma relação de diálogo.  

Tenho me comprometido a tratar o funcionalismo com respeito, 
voltar a conversar. O Estado tem se comportado como adversário

Mas diálogo não paga as contas.


Não posso prometer que vou corrigir o que (José Ivo) Sartori e Eduardo Leite deixaram de fazer. Para isso, precisa fonte de financiamento. O regime de recuperação fiscal nos impede de melhorar esta condição. Por isso, é importante uma nova relação federativa. Os servidores conhecem o nosso governo. Quando o Tarso assumiu, o brigadiano tinha o menor salário do país. Revertemos essa lógica, fizemos concurso, aparelhamos a segurança.  

O senhor costuma dizer que o PT jamais aumentou impostos, mas o PT, e o senhor, votaram a favor da prorrogação das alíquotas no ICMS em 2018 e em 2020. Não é contraditório?

  
Na primeira vez, Eduardo Leite veio conversar conosco antes da posse. Foi o primeiro governador a visitar uma bancada de oposição, pedindo uma chance. Achamos que não era justo retirar uma fatia tão importante do orçamento de alguém que estava assumindo. Ele assumiu alguns compromissos, mas não cumpriu. Na segunda votação, estávamos na pandemia, havia a guerra contra vacinas, com o presidente dizendo que não iria comprar. Então demos mais um voto de confiança.  

O senhor pretende mexer na matriz tributária?  


Temos de encontrar um caminho. Não posso me comprometer com a redução. Temos que ser responsáveis. Adequar à realidade que vive o povo que mais precisa e os setores produtivos que são importantes para a economia reagir. Tem de haver um forte diálogo, ver como vai ficar essa relação com a União, o regime de recuperação fiscal.

Qual sua política para estradas? Como pretende lidar com concessões e pedágios?


Não tenho preconceito contra concessões, e as pessoas não são contra pagar pedágio. Somos contra negócio malfeito. Esse modelo de concessão é um negócio da China para as concessionárias. O governador faz contrato de 30 anos sem dialogar com as comunidades. Um carro, para descer ou subir a Serra, gasta em torno de R$ 40, uma carreta gasta R$ 219.

O senhor vai pedagiar a RS-118?


A 118 não terá pedágio. O Estado levou 20 anos para construir a estrada, gastou R$ 400 milhões e agora que está quase toda feita vai botar pedágio em perímetros urbanos, numa região de economia deprimida. Custa R$ 120 milhões terminar a 118. Por que em vez de botar pedágio por 30 anos ele não usa o dinheiro que queria colocar nas estradas federais?

Qual sua opinião sobre a instalação de câmeras corporais dos policiais militares?

 
É uma boa medida. Onde foi implementado, tem dado bons resultados.  

Como é que o senhor pretende evitar a falência do IPE, que tem 1 milhão de usuários e deve milhões a hospitais?


Os servidores que têm condições já migraram ou estão migrando para plano particular. Os que não têm condições e não conseguem atendimento no IPE estão sobrecarregando o SUS. Qual é o problema hoje? O Estado contribui com uma parte e o usuário contribui com outra. Como deixou de ter aumento salarial, congelou o repasse dos usuários. Não posso me comprometer em resolver a situação do IPE nos primeiros meses. A melhor forma é voltar a fazer correção do salário dos servidores.  

Vamos rever a mudança curricular que o governo fez 
sem diálogo com a comunidade escolar, reduzindo 
disciplinas como história, educação física e literatura

Como é que o senhor pretende reverter os índices alarmantes da educação?

 
Vamos rever a mudança curricular que o governo fez sem diálogo com a comunidade escolar, reduzindo disciplinas como história, educação física e literatura. Vamos investir na infraestrutura das escolas, boa parte não tem pátio decente para as crianças fazerem recreação. Não tem mágica, tem que ter mais orçamento. Para tornar a escola mais atrativa, não podemos deixar criança estudar de barriga vazia. Fizemos uma grande mobilização para que o governo comprasse produtos da cesta básica para garantir alimentação das crianças na pandemia, enviamos uma lista do que as cooperativas tinham disponível em cada região. Mas o Leite comprou R$ 24 milhões de um único dono de atacadão da Região Metropolitana, os produtos vieram tudo de fora.  

O senhor falou em dar reajuste salarial, fazer o Estado induzir o desenvolvimento, duplicar estradas, investir em saúde e educação e não pretende privatizar. Tudo isso num quadro de queda de receita do ICMS e retomada de pagamento da dívida. De onde vai sair o dinheiro?  


Esse aumento de arrecadação não é só fruto de privatizações. A arrecadação aumentou também de cada litro de combustível, de cada conta de luz. O Estado também arrecadou muito descontando os aposentados. Esse ajuste fiscal deixou uma dívida social extraordinária. O governador fez caixa com o povo passando fome. Se o Estado colocar sua estrutura a serviço do desenvolvimento, a economia vai reagir. Nós vamos arrecadar mais. Se, em vez de ficar comemorando superávit, botar dinheiro nas pequenas, micros e médias empresas, fortalecer uma política à indústria, vamos produzir mais e o povo consumir. Está comprovado que se o trabalhador não guarda dinheiro no colchão, ele vai comprar mais. Quando o Lula foi presidente, o salário mínimo crescia 70% acima da inflação. Quando Tarso foi governador, o mínimo regional foi reajustado em 39%. Nós apostamos nisso. E temos de encontrar outro caminho para a dívida. Você contratar R$ 9 bilhões, pagar R$ 37 bilhões e dever R$ 73 bilhões é como encher um balde sem fundo. Não tem dinheiro que chega.  

O senhor fez um acordo com o PSOL, mas está distante de parceiros históricos na esquerda, como PDT e PSB. Num eventual segundo turno, como ampliar a votação?


Fiquei toda a pré-campanha sendo acusado do isolamento. Agora estamos com cinco partidos e vocês ainda dizem que estamos desunidos. Não faltou esforço para termos o PDT e o PSB. O PDT tem candidato nacional. Com o PSB é mais complicado, estava até agora com Sartori e com Leite, ajudou a aprovar as reformas. Mas considero o PSB no mesmo campo progressista que nós. Foram horas e horas de reuniões, mas não deu. Vamos estar no segundo turno e tenho certeza de que há plenas condições de PDT e PSB estarem conosco e nós vencermos as eleições.

Material retirado do jornal Zero Hora


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